A
Jurema Sagrada ainda não consta no livro de registro de patrimônio imaterial do
Brasil? São mais de 500 anos de historia, sendo a Jurema de Matriz indígena e
tendo incorporado valores africanos e cristãos ao longo desse período, as
politicas governamentais, ainda não programaram politicas afirmativas e
inclusivas para proteção da Jurema em todo nordeste, a exemplo do suposto
tombamento do Acaes feito pelo Instituto do Patrimônio histórico e Artístico do
Estado da Paraíba – IPHAEP em novembro de 2010, onde um simples comunicado para
os supostos atuais proprietários do Acaes, até o momento não foi feito por não
identificarem o atual proprietário, a atual politica de patrimônio cultural imaterial
do Brasil esta foi pautada a partir das cartas patrimoniais elaboradas pela
UNESCO depois de inúmeras discursões em vários países do mundo. Na Paraíba a
efetivação dessas politicas ficam mais complicada quando o estados perde sua
laicidade e dar espaço a intolerância e a falta de respeito a diversidade religiosa.
Atualmente
um dos últimos exemplares de Templo tradicional de Jurema esta sendo vítima de
intolerância de seguimentos neopentecostais e descaso das instituições
governamentais, sabemos que nosso povo sempre foi vítima de discriminações e
que o estado sempre foi conivente, porém estamos vivendo novos paradigmas que vislumbram
uma reparação histórica aos povos de Terreiros, temos outro grande problema a
enfrentar, a falta de articulação e organização e ausência de uma discursão
politico teológica que nos deixa mais reféns
e vulneráveis aos ataques de organizações judaico-cristãs.
Conforme
informações a me repassadas por João Paulino, neto legitimo da Mestra
Jardecilha também conhecida por Zefa de Tiíno, como registrou o Professor Ms
Sandro Guimarães em sua obra, À Sombra da Jurema Encantada;
Nascida
no município de Alhandra – PB, no dia 11 de junho de 1934, aos cinco anos de
idade começou o contato com entidades da jurema aos nove anos já tinha o
controle do sua mediunidade, e começou a consultar sozinha, afilhada da Mestra
Maria do Acais, que no seu batizado, no mesmo ano de seu nascimento, afirmou
que ela seria uma grande Mestra de Alhandra, só que não estaria viva para
presenciar o fato. Maria do Acaes viera há falecer três anos depois. Seu pai
João Pedro era cabeça de mesa de Maria do Acais, entendendo assim a proximidade
da escolha da comadre.
Cabeça
de mesa é aquele Mestre ou Mestra que auxilia e coordena as ritualísticas de
Jurema de Mesa e sempre é uma pessoa de extrema confiança da Mestra dirigente.
Mestra
Jardecilha começou a consultar na casa de seus pais, ainda criança, pois eles
temiam a perseguição que os juremeiros sofriam, portanto a mestra não podia dar
toques, para não chamar a atenção dos perseguidores no caso, a Policia.
Vale
salientar que na Paraíba a perseguição durante o estado novo deixou marcas
profundas nas religiões de Matriz africana e afroindigena.
Aos
16 anos de idade a mestra Jardecilha casou com João Paulino de Souza, saindo
então de casa dos pais para morar em sua própria casa porem vizinha a casa dos
seus pais (nas terras que se encontra sua cidade de jurema) teve 14 filhos
sendo que biológicos se encontra apenas uma filha, Severina Paulino (Nina) que
reside na mesma casa da mestra e que cuida da cidade de jurema mantendo-a ativa
até os dias de hoje, e outra filha adotiva que nada faz pela cidade.
Assim
que casou a mestra Jardecilha continuou consultando porem agora em sua casa, no
governo de João Agripino foi liberado e reconhecido o direito dos cultos
afro-indígenas na Paraíba no ano de 1966, porém no ano seguinte, em 1967 a
mestra começou a dar os torés de caboclos no terreiro de sua casa, os torés de
caboclos eram feitos apenas com as maracás, a mestra Jardecilha foi a primeira
mestra de Alhandra a começar a realizá-los com introdução dos elús, grande
sinal de originalidade e distinção.
A
Mestra foi certamente protagonista nas reelaborações e contribui assim para a
Umbandização da Jurema na Paraíba,
A
vida da mestra Jardecilha foi dedicada inteiramente ao culto da jurema dos 9
anos até os 54, idade de seu falecimento, ela realizou inúmeros trabalhos de
curas, principal atribuição dada a Jardecilha, conhecida popularmente como “TIA
ZEFA”, também muito caridosa tinha sua casa sempre cheia de gente,nunca teve
horário pra atender, seja de manhã, de madrugada, a tarde ela sempre estava
disponível pra atender de simples consultas a casos de emergência, muito por
precisarem de seus trabalhos e muitos por necessidade de fome, e favores,
conhecida também como mãe da pobreza tia zefa ou mestra Jardecilha, dava
refeições aos necessitados, fazia casamentos, providenciava velórios, quando os
parentes não tinham condições, muitos pessoas a tomaram como madrinhas de seus
filhos por terem seguro a festas e os custos, sendo assim não se espanta saber
que a mestra Jardecilha morreu com mais de 600 afilhados apenas de batismos
católicos, não contabilizando os seus afilhados de jurema.
A
influência de Mestra Jardecilha pode ser comparado a de Maria Acaes e sua
liderança e poder de articulação são merecedoras de estudos acadêmicos ainda
não realizados. O sentimento de dupla pertença é uma das marcas dos grandes
mestres Juremeiros.
Além
de juremeira, a mestra Jardecilha também era muito católica, durante 39 anos
ela realizava procissões devido a promessas, no mês de janeiro a São Sebastião,
junho do Senhor São João Batista e em Dezembro da Virgem da Conceição, de quem
era devota, com as procissões, ela mobilizava junto a igreja multidões de
pessoas da cidade e dos municípios vizinhos. No ápice de sua mediunidade, a
mestra Jardecilha já era muito conhecida, em 1973 foi convidada pelo então
presidente da federação Carlos Leal para assumir a diretoria da Federação Espírita dos
Cultos Africanos do Estado da Paraíba onde se ficou até sua morte.
Durante
muitos anos a jurema em Alhandra foi alvo de muitos olhares, a Mestra Jardecilha,
Mestre Inácio, Mestre Biu Toré, Mestre Zé Quati, Mestre Flósculo, Mestre
Zezinho do Acais, Mestre Adauto, Mestre Cesário e Mestra Damiana, valorizaram o
culto da jurema de uma forma avassaladora.
Na
década de 70 a mestra Jardecilha recebeu em seu terreiro a BBC de Londres, que
realizou um trabalho de forma acentuada sobre os cultos da Jurema no nordeste
brasileiro.
Houve
um reconhecimento internacional que precisa ser retomando afim de identificar e
fortalecer essa tradição.
A
mãe da mestra Jardecilha deu um terreno a ela assim que casou, onde construiu
sua casa, e ergueu sua cidade de jurema e firmou seu cruzeiro, seu salão era
nos fundo de sua casa até o ano de 87 quando construiu de forma mais
confortável seu templo.
Como
relata o professor Ms. Sandro Guimarães a cidade da Mestra Jardecilha foi
Plantada no contexto da Umbanda, e é composta de jurema-preta e jurema-branca e
é o mais novo dos Santuários de Alhandra entre eles os pés de Jurema do Mestre
Manoel Cadete, Mestre José da Paz e o do Mestre Bom Floral, além do da própria
Mestra Jardecilha que plantou sua cidade seguindo as tradições dos Mestres de
Alhandra pouco antes de falecer.
No
ano de 2009 familiares que são contra o culto fizeram a partilha definitiva dos
lotes, manobrando os limites de forma que a jurema do mestre major do dia ficasse
fora do lote, A proprietária do lote em que erroneamente se encontrava a jurema
ameaçou cortá-la, junta a todos conseguimos comprá-la judicialmente por
4.000,00.
Com
a morte do marido da mestra Jardecilha, os herdeiros querem acordos absurdos,
na esperança de aniquilarem definitivamente a cidade de jurema, começaram a
invasão imprópria do bem, cortando recentemente 3 pés de juremas, a cidade de
jurema hoje contem nove pés, um templo as firmações dos exus e dos pretos
velhos e o cruzeiro mestre, a uma reunião no mês passado ao IPHAEP, recebemos
as informações que a saída de melhor resultado seria o tombamento do valor
material e imaterial da cidade de jurema, mas que precisaríamos de mais apoio,
pra que o órgão se conscientize de que a cidade tem valor não só pra nós que
moramos aqui e sim pra todos os da religião.
As
quantias são irrisórias, as partes opostas apresentaram uma avaliação de
200.000,00 sendo repartidas em partes iguais por volta de 67.000,00 não levando
em consideração os beneficio e benfeitorias feitas por nós desde que a casa e o
templo foram feitos já que ninguém mais teve a posse dele depois que a mestra Jardecilha
morreu. A vizinha ainda deseja 7m da profundidade, comprometendo a jurema de
mestre Manoel cadete e a firmação dos exus.
Enfim
faz-se necessário uma tomada de atitude para de fato salvarmos essa relíquia da
Jurema e as entidades que fomentam ações afirmativas sejam no âmbito da
academia ou do movimento social precisam de fato tomar uma atitude para que o
tombamento ou reconhecimento como patrimônio imaterial da Paraíba e do Brasil
sejam de fato uma realidade.
João Monteiro
Historiador, Especialista em Preservação de Acervos Gráficos
Membro da coordenação do QCM